quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Carlos Vereza no Jô Soares e o blog Reinaldo Azevedo: o caminho inequívoco para o reacionarismo

Durante a manhã de hoje me vi na minha rotina habitual de ler via Internet os principais jornais e revistas do país, além de sites e blogs de opinião. Me deparei na revista Veja com o blog do Reinaldo Azevedo, aquele jornalista culto que insiste em nos convencer de que a fracassada revista editorada por ele, e mais tarde parte do seu património pessoal, Primeira Leitura, era uma revista isenta, imparcial e sem nenhum compromisso partidário com os tucanos. A negativa esbarra no fato que o seu chefe era o ex-ministro das telecomunicações do governo FHC Luiz Carlos Mendonça de Barros. O mesmo ministro flagrado em ligações telefónicas armando no leilão da telefonia para privilegiar um determinado grupo económico. Por isso caiu.


O argumento utilizado contra a revista Primeira Leitura por si só é pouco e desqualificante como insiste o Reinaldo. Ocorre entretanto que se formos analisar o conteúdo das matérias publicadas pela revista ao longo dos últimos anos do governo FHC fica evidente a conotação ideológica em defesa deste governo, inclusive sem nenhuma reticência relevante. Ou será que o governo de FHC constituiu um marco da moralidade pública brasileira?


Em relação ao governo Lula desde o primeiro mês de mandato a revista atacava impiedosamente todos os aspectos da sua eleição caracterizando o povo como ignorante, que a máquina partidária petista iria aparelhar o estado, decretar o socialismo e etc. Esta polêmica não poderia ser resolvida em apenas um artigo dada a quantidade de questões que foram abordadas em inúmeros outros. Mas quem já leu a revista e tem o mínimo de honestidade intelectual pode afirmar sem hesitar a tendência política da revista, da mesma forma como seria desonesto não reconhecer a tendência pró-Lula da revista Carta Capital.


Mas o que me despertou a atenção não foi a polêmica envolvendo a revista Primeira Leitura e muito menos as opiniões já previsíveis do Reinaldo Azevedo acerca de qualquer coisa. Em uma das postagens intitulada "Carlos Vereza no Jô Soares" o jornalista, literato, filósofo, cientista político, economista, linguista, semiólogo, antropólogo e ex-trotskista, este último preocupante dado o grande número de colegas como Palocci e cia, ressalta a entrevista cedida pelo ator Carlos Vereza no programa do Jô Soares.


Na postagem está disponibilizada um trecho da entrevista (http://br.youtube.com/watch?v=1xxkJ-kZo08) do ator e ainda foram destacados dois trechos. Vejamos:
  1. “O Lula é uma invenção da USP, da Unicamp e das Comunidades Eclesiais de Base, com o aval do falecido Golbery do Couto e Silva (...) O que era um grande líder metalúrgico transformou-se na glamourização do apedeuta, na glamourização da ignorância”.
  2. “O PT não me engana (...) Foi a oposição mais cruel, mais feroz, mais desonesta que se fez a todas as tentativas boas e generosas de mudar o país. Eles eram contra. Levavam apito, pandeiro, batiam na bancada no Congresso, né? E com um discurso da ética, da moralidade, da virtude, como se eles detivessem o monopólio da virtude, da verdade, da honestidade. E chegam ao poder sem projeto de governo (...)"

No trecho 1 o ator infere que a maior liderança popular da América Latina nos últimos vinte anos nada mais foi do que uma invenção de alguns setores da esquerda brasileira. E o pior, na citação o Reinaldo Azevedo suprime a primeira frase na qual o Carlos Vereza fala "Com todo o respeito" e depois vem a pedrada da glamourização do apedeuta.

No trecho 2 quase não consigo escrever de tanto rir. Ele afirma que o PT foi um monstro que barrou no congresso nacional "todas as tentativas generosas de mudar o país". Generosas? Tipo a privatização da Vale do Rio Doce, o escândalo da compra de votos para a reeleição do Farol de Alexandria, as comemorações pelos 500 anos de descobrimento (e a Nau ate hoje não saiu), o escândalo da privatização nas telecomunicações, o ensaio da privatização da Petrobrás, a criminalização dos movimentos sociais, o mais pífio crescimento econômico da historia recente do Brasil, o Cacciola, a duplicação da divida pública brasileira em apenas quatro anos? Olha o Carlos Vereza, creio eu, deve sofrer de Síndrome de Estocolmo.

Ainda na mesma entrevista ocorreu a pior bajulação pública da historia televisiva recente do Brasil. O Carlos Vereza agradece ao Jô e as suas meninas pelo belo exemplo de profissionalismo e afirma que aquela havia sido a única tribuna livre durante o escândalo do mensalão. Esta tentativa foi um elemento discursivo infeliz para registrar legitimidade ao conjunto de afirmações que ele viria posteriormente fazer sobre a natureza deste governo. Aproximando-se do público médio através da sua principal referencial intelectual, por incrível que pareça o Jô, ele confere ao público daquele programa, sem o risco de ser rechaçado, conclusões facilmente desconstruídas pela Historia e pela Lógica.

A não ser que o Carlos Vereza acredite verdadeiramente que o governo Lula tenha tido um caráter mais repressivo com a população do que os governos anteriores. Basta avaliar as grandes manifestações populares e a ação da polícia em Brasília. Já com a vanguarda da esquerda brasileira José Serra não creio que se possa afirmar o mesmo.

Para encerrar esta discussão vamos definir o conceito, ou a utopia, histórico das pessoas que se reivindicam de esquerda no mundo.

  1. Ser de esquerda significa estar ao lado da parcela oprimida e excluída de qualquer sociedade na sua luta por emancipação política. Dos direitos sociais a afirmação dos direitos individuais.
  2. A esquerda moderna se formou a partir das divêrgencias ocorridas na revolução francesa acerca dos encaminhamentos dos direitos sociais e individuais antes, durante e depois do processo revolucionário. Do liberalismo de esquerda até as primeiras correntes socialistas com Babeuf, Saint Simom, Owen e Fourier.
  3. A esquerda como sendo constituída por correntes políticas que se identificam a partir das premissas anteriormente citadas, é rica em diversidade de opiniões e visões de mundo.
  4. O marxismo é uma destas correntes políticas. Sem duvida a mais influente e mais consequente em virtude do seu arcabouço teórico e capacidade crítica em relação a sociedade capitalista.
  5. Mesmo dentro do marxismo temos diversas correntes de pensamento que diferem entre si. Por isto mesmo seria de um reducionismo absurdo nivela-las indistintamente.
  6. Por último ser de esquerda significa estar na luta efetiva pela conquista dos direitos políticos, sociais, econômicos e na defesa dos direitos humanos.

Sinceramente querer fazer crer que a defesa do liberalismo econômico e da intransigência das grandes corporações são os valores de uma esquerda contextualizada é puro sofisma. O mais decente é que os designatarios da Daslu, da Monsanto, do Agrobusiness, dos grupos de extermínio, das minas de carvão e da UDR (braço armado ruralista) defendam publicamente o seu ideário de sociedade sem querer criar confusão ideológica em nome do povo. Senhor Carlos Vereza por favor: nos poupe de sua estupidez.


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